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Smart Cities: Nordeste tem iniciativas promissoras , mas precisa de programa unificado

Daqui a algumas décadas, a tecnologia vai transformar ainda mais a maneira
como nos relacionamos com o mundo.

Não teremos mais tantos problemas com a mobilidade. Será possível saber pelo smartphone se o ônibus que você precisa pegar está chegando ao ponto mais próximo da sua casa.

Por causa da facilidade para utilizar transporte público, algumas pessoas irão optar por meios alternativos ao carro como metrô, ônibus, veículo leve sobre trilho e bicicletas. E essa escolha vai descongestionar as vias.

Mesmo quando for preciso utilizar o carro, o motorista terá mais facilidades. Será possível verificar, no painel do veículo, onde está a vaga de estacionamento mais próxima. Nas esquinas, totens também informarão se as ruas dispõem de vagas. Quem estiver sem automóvel poderá pagar pelo compartilhamento de um carro elétrico - transportes silenciosos e com zero emissão de poluentes - até a estação mais próxima do seu local de destino.

Com a energia - que hoje passa por um colapso, por causa do baixo nível dos principais mananciais do país, não será diferente. As smart grids vão possibilitar uma economia sem limites às cidades. A iluminação de praças será regulada de acordo com horário e movimento por meio de sensores. Quando houver poucas pessoas no ambiente, a luz será reduzida. Muito movimento, maior intensidade de luz. O seu celular vai avisar, se você tiver esquecido algum aparelho eletrodoméstico ligado e, através dele mesmo, você poderá
desligá-lo. As residências vão produzir energia por meio de placas fotovoltaicas e, mesmo aquelas de veraneio, que permanecem fechadas na maior parte
do ano, poderão enviar os watts produzidos para a concessionária e, em troca, obter desconto em suas contas de luz. Um ambiente muito mais sustentável
onde as bicicletas, o seu medidor e, até as lombadas das ruas, produzem energia.

Na verdade, todas essas soluções futuristas, que fazem parte do conceito de Smart Cities (Cidades Inteligentes) já são utilizadas ou testadas na região
Nordeste. Em Salvador (BA), no dia 26 de maio, foi inaugurado o Centro de Controle Operacional da Secretaria de Mobilidade Urbana, no bairro de Amaralina. O centro monitora, em tempo real, todos os 2,7 mil ônibus da frota. Para isso, foi implantado GPS em todos os veículos e nos mais de três mil pontos de parada da cidade. Agora, é possível identificar o roteiro dos ônibus, o tempo de circulação deles, as paradas nos pontos, e promover mudança de itinerário caso seja visualizada alguma eventualidade.

A utilização de georeferenciamento reduz significativamente os gastos com o monitoramento, já que substitui a necessidade de contratar um fiscal para cada linha, turno, bairro, garagem e estação de transbordo. Além do centro, a prefeitura aderiu ao CittaMobi (leia na página 48 a avaliação que nossa equipe fez do aplicativo), aplicativo gratuito que, entre as várias funcionalidades, permite aos mais de 1,3 milhão de usuários localizar os pontos de ônibus mais próximos, a previsão de chegada do veículo, quantos ônibus estão circulando e onde eles se encontram. O monitoramento e o aplicativo são produzidos pela empresa pernambucana, Cittati Tecnologia e também estão disponíveis nas cidades de João Pessoa (PB), Parnamirim (RN), Maceió (AL) e na Grande Recife (PE). Aracaju (SE) já implantou o Centro de Controle, mas ainda não dispõe do aplicativo.

O gerente comercial da Cittati Tecnologia, Carlos Sampaio, conta que não esperava uma expansão tão grande em tão pouco tempo. Com seis anos de atuação, o negócio, que começou no Porto Digital já atende 11 estados do país. "Com dois meses de lançamento em Salvador, 220 mil pessoas baixaram o aplicativo e 37 milhões de consultas foram realizadas. Em Recife, primeira
cidade onde foi implantado, 500 mil pessoas utilizam o CittaMobi", conta Sampaio.

Porto Leve e L.O.U.C.O
E por falar em Porto Digital, o quadrilátero de 100 Hectares é, ultimamente, um dos principais Living Lab (laboratório urbano para o teste de soluções tecnológicas) do Nordeste, quando o assunto é Cidades Inteligentes e Internet das Coisas. O polo dispõe de dois grandes projetos em andamento: o Porto Leve para mobilidade e o L.O.U.C.O - Laboratório de Objetos urbanos Conectados.

O Porto Leve já tem mais de três anos de existência e conta com o apoio do Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação, do Governo do Estado de Pernambuco e da empresa Serttel. O objetivo do projeto é testar soluções voltadas para a mobilidade dentro do bairro do Recife, onde está localizado o Porto Digital. Quando dá certo, a ferramenta ultrapassa os limites do bairro e ganha o mundo. Dentre as cinco soluções para a mobilidade urbana desenvolvidas pelo Porto Leve, a novidade está no compartilhamento de carros elétricos, muito parecido com o de bicicletas, que já é feito em três cidades de Pernambuco, em Salvador, Fortaleza e Aracaju. O interessado no compartilhamento cadastra-se no aplicativo, compra créditos e, em seguida, pode utilizar os carros pequenos, silenciosos e de energia limpa.

O compartilhamento está em fase de teste há seis meses, por isso é gratuito e só pode ser feito dentro do bairro do Recife. Os carros, com dois lugares, foram
cedidos pela Serttel, por sinal, outra pernambucana de peso no mercado. Os veículos podem circular até 120 quilômetros após receber uma carga de seis
horas. Atualmente há três carros, dois em circulação e um para backup, distribuídos nas três estações do bairro. "Em breve, eles entrarão em atividade plena. Já estamos planejando a disponibilização comercial deles", diz Jacques Barcia, consultor de tendências tecnológicas do Porto Digital.

Segundo Barcia, a experiência é pioneira e está focada em incentivar a carona. "Eu tenho conhecimento o uso de carros elétricos, mas não com esse
conceito de compartilhamento. Além do aluguel, o aplicativo dispõe de uma aba para compartilhamento entre pessoas. Alguém pode se cadastrar para pegar
uma carona e rachar o valor do aluguel. Isso reduz a quantidade de veículos na cidade", opina. Para ele, o principal problema do carro é a maneira como é
utilizado. "Hoje em dia, um casal tem dois veículos, um para cada pessoa. Vizinhos se dirigem ao mesmo local, mas não compartilham do mesmo veículo.
O carro não é um problema, ele é um facilitador e, quando a gente quebra essa cadeia de veículo como propriedade, se torna mais sustentável e reduz os
engarrafamentos", completa.

Outra ação do porto leve é a zona azul digital. Motoristas se cadastram no aplicativo, o usuário estaciona seu veículo, acessa o aplicativo e ativa seu
tíquete da Zona Azul, indicando a placa do carro que estacionou. O pagamento é feito via cartão de crédito e, no carro, não fica nenhum papel. O agente
de trânsito tem um aparelho que consulta a placa no sistema, informando se o veículo tem ou não um tíquete de estacionamento. Os condutores também
podem saber em tempo real a quantidade de vagas livres em cada via do Bairro do Recife, por meio do aplicativo 'Procurar Vagas', outra ação do porto leve.
Por enquanto, a alimentação do número de vagas disponíveis no software é feita manualmente por agentes, mas segundo o consultor de tendências
tecnológicas, outro dispositivo em fase de desenvolvimento, o 'Estacionamento Inteligente' será atualizado automaticamente por meio de sensores. Além disso, esses espaços serão integrados com outros modais como carro elétrico e bicicleta.

Barcia diz que já sente os impactos positivos das soluções. "Nosso grande case foram as bicicletas do Porto Bike, que depois foram expandidas para outros locais. Elas provocaram uma grande mudança na cidade. Percebemos a classe média adotando o modal e deixando o carro de lado para fazer percurso curto. Tivemos períodos de transtornos, de parar o trânsito daqui, e a solução foi a bike. As pessoas pensam que mobilidade urbana é ter mais ruas para circular, mas é, justamente, ter mais opções de veículos", diz. O próprio consultor optou pela bicicleta e conseguiu uma economia de 25 minutos no tempo para chegar ao trabalho: "Percebi que, de carro eu fazia o percurso em 40 minutos, mesmo tempo do meu deslocamento a pé e de bicicleta faço em 15 minutos".

Enquanto o Porto Leve já alçou vôos, o L.O.U.C.O está em fase de gestação. E já tem mês previsto para o nascimento: janeiro de 2016. Só para o processo de aquisição de equipamentos, o laboratório contou com recurso de R$ 450 mil da Fundação de Amparo à Ciência e tecnologia do Estado de Pernambuco (Facep).
Na lista, aparelhos de ponta como sensores, aturadores, placas e kits de robótica Arduino e Raspberry Pi e computadores adaptados. E, quem for "LOUCO" o suficiente pelo universo das coisas conectadas pode sentir-se à vontade para participar do edital de chamamento.

"Nossa ideia é fazer com que, tanto estudantes da Universidade Federal de Pernambuco, como donos de empresas iniciantes adotem um problema que nós vamos expor e tentem resolvê-los. "Nós vamos oferecer o problema
e, quem topar o desafio de solucioná-lo terá, à disposição, todos os equipamentos do laboratório mais mentoria e consultoria para que
ganhe expertise. A partir daí, o objetivo é que as ideias se tornem Startups e, em seguida, grandes empresas", afirma Jacques Barcia. Ele diz que as soluções devem atender a problemas urbanos diversos, desde o monitoramento
de água, ar, microclima, saúde, à mobilidade. "O legal e o difícil é que, por ser tão aberto, é difícil criar soluções fora do óbvio", opina.

Smart Grids
Outro conceito muito relacionado ao de Smart Cities é o de Smart Grids, em português, Redes Inteligentes. As redes inteligentes de energia incluem uma série de mudanças, como a adoção do medidor digital, a utilização de diferentes
fontes, eólica, solar e melhor gestão e monitoramento da energia distribuída. Os prejuízos com perdas não técnicas de energia, segundo a Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel), são de cerca de R$ 7 bilhões ao ano no Brasil. São
consideradas perdas não-técnicas os erros de medição, as deficiências no processo de faturamento, a falta de medidor em unidades consumidoras,
as fraudes e furtos de energia. Todo esse prejuízo ou, pelo menos, parte dele, poderia ser evitado se o sistema elétrico do país contasse com uma comunicação de mão dupla entre as residências e a operadora, com sensores ao longo de toda a rede, controle e automatização do consumo residencial.

A Lei Federal nº. 9.991, de 24 de julho de 2000, estabelece que empresas concessionárias, permissionárias e autorizadas à produção independente de energia elétrica são obrigadas a realizar investimentos mínimos em Pesquisa,
Desenvolvimento Tecnológico (PampD) e Eficiência Energética. Atenta à tendência e ao que determina a lei, a Ampla, distribuidora de energia
elétrica que atende ao interior do Estado do Rio de Janeiro, investiu R$ 40 milhões para implantar o primeiro projeto de cidade inteligente do Brasil
com foco na eficiência energética em Búzios. Do total investido, 17 milhões vêm do fundo de pesquisa da Aneel e o restante, de recursos próprios
e de empresas parceiras.

Por meio do projeto, foram implantadas 150 luminárias LED integradas à rede inteligente. Os novos equipamentos permitem reduzir o consumo em até
60%, já que têm maior vida útil e diminuem os custos com manutenção. Além disso, as lâmpadas são reguladas de acordo com horário e o fluxo das pessoas. Dez mil clientes já contam com medição de consumo inteligente. A concessionária também está investindo em bicicletas e carros elétricos, por isso, seis eletropostos estão previstos para o balneário. Além disso, casas de veraneio podem produzir energia por meio de placas fotovoltaicas e distribuir para a Ampla em troca de desconto na conta de luz e prédios inteligentes são
controlados remotamente. Na academia, os aparelhos de som conectados às bicicletas ergométricas são acionados quando se pedala.

Em Fernando de Noronha (PE), ilha reconhecida pela Unesco como Patrimônio Mundial Natural, a Companhia Energética de Pernambuco (Celp) também
pretende implantar, em quatro anos e meio, as primeiras Redes Elétricas Inteligentes do Estado. A Companhia informou que já deu início ao sistema
que vai reunir as principais tecnologias nas áreas de medição, elecomunicações, tecnologia da informação e automação em um único produto. O investimento será de R$ 17,6 milhões.

Na rede de distribuição de energia, foram instalados equipamentos automatizados como religadores um sinalizador de faltas que acusa ocorrências
operacionais no sistema elétrico da área. Entre as ações previstas, está a instalação de cerca de 850 medidores inteligentes em todas as unidades consumidoras da ilha. Atualmente, Fernando de Noronha conta com a Usina Solar Noronha I, Inaugura em julho de 2014. A usina está situada no Comando
da Aeronáutica, em um terreno de 5.000 metros quadrados, e tem potência instalada de 400 kWp (quilowatt-pico), o que resulta na geração estimada
de 600 MWh/ano. Uma segunda usina solar, concebida em parceria com o Governo de Pernambuco, encontra-se em fase de conclusão. As duas unidades
juntas serão responsáveis por cerca de 10% do consumo de energia elétrica do arquipélago.

No Ceará, a Companhia Energética do Ceará (Coelce) desenvolve dois projetos, um de Redes Inteligentes para Automação do Sistema Elétrico e o outro, chamado de Microredes, ambos em Aquiraz (a 32 km de Fortaleza). O primeiro pretende identificar e localizar faltas de energia e, automaticamente,
reconfigurar as disposições de equipamentos para isolar o defeito e devolver o fornecimento de energia para o maior número de clientes possível. Para a
operação desse projeto, foi construída uma rede de comunicação de alta velocidade e confiabilidade e instalados religadores especiais na rede de distribuição, em parceria com a Universidade Federal do Ceará. O sistema passa por testes e homolagação,mas, segundo a Coelce, deve entrar em operação no segundo semestre deste ano.

O segundo consiste em desenvolver, no loteamento Alphaville, um produto voltado para condomínios, baseado em geração própria de energia, distribuição autônoma na forma de microrrede, acumulação em baterias e automação residencial. O projeto vai atender as áreas de lazer, portaria e vias do condomínio, além de mais dez residências de alto consumo (em média 780 kWh/mês). A microrrede terá infraestrutura de geração baseada em fonte
solar e eólica, infraestrutura de armazenamento central em baterias de íon-Li e armazenamento local em baterias de chumbo-ácido. Também será criado um sistema de controle central para controlar os procedimentos de carga e descarga da bateria central e a operação da microrrede em modo ilhado.
Outro sistema de controle local, complementado por softwares interativos, irá gerenciar as cargas prioritárias de cada unidade consumidora. Este segundo
projeto está previsto para ser concluído no próximo ano, conforme a Coelce.

Lombadas como fonte de energia
Além das iniciativas de concessionárias, Startups também fazem a sua parte desenvolvendo ferramentas inovadoras para, em seguida, comercializar e apresentar ao Governo Estadual e Municipal. No Parque de Desenvolvimento Tecnológico do Ceará, a SIAC (Sistemas Inteligentes de Automação e Controle), uma das 12 empresas incubadas, está
desenvolvendo a lombada que gera energia. O engenheiro e diretor de automação da empresa, Ícaro Fontenele, conta que o projeto vem sendo desenvolvido desde 2013, e já passou por duas etapas de um edital do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).

"Consiste em criar um sistema hidráulico fechado que movimenta microgeradores, embaixo a estrutura do quebra-molas. O veículo tem energia cinética convertida em potencial e a nossa usina vai converter a energia potencial em elétrica", explica Ícaro.

Segundo ele, enquanto o sistema de aerogerador eólica custa em média 400 mil e o solar 100 mil, a usina para lombadas em vias custa, em média, 38 mil. "Uma lombada instalada em duas ruas produzirá, em média, 10 quilowatts
hora (Kwh) e, no máximo, 20 Kwh", complementa. O preço médio do Kwh, segundo ele, é de 0,18 centavos, enquanto o solar é R$ 0,30 e o eólico, R$ 0,18. A Siac já entrou com o pedido de patente da ideia. O engenheiro diz que pretende instalar o sistema em locais de muito movimento, como Shopping Centers. Depois de pronto, a empresa tentará vender para as concessionárias.

Ícaro explica que qualquer equipamento que tem contato com a produção de energia potencial, pode ser adaptado para transformá-la em energia elétrica, como as bicicletas ergométricas, em Búzios. O importante é que a invenção seja eficiente, ou seja, é preciso analisar o custo-benefício do sistema. Com três anos de existência, a Siac está sempre criando produtos inovadores e
submetendo-os a editais. Este já é o terceiro projeto desenvolvido pela empresa.

Investimento
Pequenas empresas brasileiras que apostaram em mobile, inovação e soluções para problemas urbanos viram a receita ampliar rapidamente. A Serttel é uma delas. Em dois anos, a empresa, focada em tecnologias inovadoras para a mobilidade, projeta um aumento de 50% no faturamento, passando dos R$ 200 milhões, registrados em 2014, para R$ 300 milhões em 2016. Fundada por Ângelo Leite, um engenheiro eletricista natural de Petrolina, a empresa tem hoje, aos 25 anos de existência, dois mil colaboradores atua em 13 estados brasileiros e possui uma sucursal em Buenos Aires, na Argentina. O grande salto da Serttel deveu-se, principalmente, à percepção de mercado que o engenheiro teve ao investir em soluções para o trânsito e deixar de lado o produto inicial da empresa: o conserto de teclados.

As expectativas são boas para o mercado da 3ª plataforma, que engloba a mobilidade, cloud, Big Data, Redes Sociais e Internet das Coisas. No ano
passado, o mercado brasileiro de aparelhos conectados à internet movimentou em torno de dois bilhões de dólares, de acordo com a IDC Brasil.
E, este ano, conforme a empresa de consultoria, deve continuar em expansão.
A estimativa é de que 130 milhões de dispositivos estejam conectados, o correspondente a quase metade de 'coisas' conectadas na América
Latina. O gerente de pesquisas e consultoria de Enterpri e da IDC Brasil, Pietro Delai afirma que os CIOs estão cada vez mais atentos a esse mercado, mas pondera que ainda há muitas dúvidas, especialmente em relação à cloud, segurança, networking e ao modelo de negócios. Ainda assim, a expectativa é de que as grandes empresas sejam as principais investidoras neste modelo - 19% têm planos para os próximos 12 meses - em busca de melhoria da
qualidade de produtos e serviços, além do aumento de produtividade. Também relacionado às cidades inteligentes, o mercado de Big Data deverá encerrar o ano com US$ 788 milhões de investimentos no Brasil. Ao todo, o mercado
brasileiro de TIC deve movimentar 165,5 bilhões de dólares.

A administração pública também vem investindo em projetos relacionados à Big Data, Cloud, Internet das Coisas e Cidades Inteligentes. Além do investimento de quase meio milhão da Facep no L.O.U.C.O, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) também lançou, em abril, edital que disponibiliza entre R$500 mil e um milhão para projetos relacionados
a essas subáreas de TI. Segundo a assessoria de imprensa da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), entre 2011 e 2014, foram investidos, proximadamente, R$800 milhões em contratos de financiamento e recursos não reembolsáveis relacionados a temas de Internet das Coisas e Cidades Inteligentes. Em 2015, foram investidos, aproximadamente R$ 70 milhões.

Modelos e autores
É claro que as Smart Cities estão diretamente relacionadas ao uso de tecnologias para uma melhor gestão do território urbano. Entretanto, o conceito
não se resume a um único modelo de cidade. Para o assessor da Superintendência de Desenvolvimento Industrial da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Maurício West Pedrão, as Smart Cities são caracterizadas por seis dimensões fundamentais: economia, mobilidade, meio ambiente, pessoas, qualidade de vida e governança.

Cada cidade, segundo ele, está focada em um modelo: "Existem cidades sendo criadas do zero, como New Songdo algumas focadas em soluções colaborativas, outras que têm investido muito em mobilidade urbana sustentável, como Amsterdã ou em sustentabilidade energética, como Copenhague. Mas as cidades do Nordeste brasileiro não devem copiar modelos. Elas devem pesquisar opções que melhor resolvam os problemas de cada uma delas", afirma. Ele dá o exemplo de Salvador que, como aponta, tem um sério problema que é a ausência de espaços para a caminhada segura e confortável.
"Primeiro, porque é uma cidade que não foi e nem está sendo projetada para pedestres. Segundo, porque estamos em um país tropical, temos um clima
caracterizado por altas temperaturas e não temos sombras para caminhar, principalmente na Orla. São problemas próprios, característicos, que precisam
ser pensados", afirma.

Na opinião do assessor da Fieb, as iniciativas de cidades nordestinas como Salvador, apesar de plausíveis, ainda ocorrem de forma isolada. "No
caso de Salvador, nós temos, de um lado o Centro de Controle Operacional para monitorar a mobilidade por parte da Prefeitura, na Orla de outro, o
Centro Integrado de Comando e Controle Regional para monitorar a segurança, por parte do Governo do Estado, no CAB. As ações deveriam se conversar,
mas se dão separadamente", diz.

Para ele, a agenda dos gestores é muito influenciada pelas questões eleitorais e é isso que afasta a possibilidade de um planejamento de longo prazo e
articulado entre as diversas secretarias do governo municipal e estadual: "A solução para essa questão passa necessariamente pelo fortalecimento das
instituições, comandadas por técnicos comprometidos com resultados, sem imediatismos. Não teremos um projeto de Cidade Inteligente sem planejamento
sólido que dure, no mínimo, dez anos". Não dá para imaginar a implantação de Smart Cities, segundo Pedrão, sem uma articulação entre as empresas,
a sociedade organizada e a administração pública. "Cada esfera tem o seu papel. As empresas disponibilizam soluções, investimento e inovação a sociedade organizada, inclusive em ONGs, apoia, contribui e corrobora as iniciativas e o Governo dá condições, por meio de licitações, regras, regulando os resultados efetivos", complementa.

O doutorando em mídias locativas pela Universidade Federal da Bahia, Adelino Mont'Alverne propõe, em sua pesquisa, que os modelos de Cidades Inteligentes são diferentes, porque os autores são diferentes. "A busca pelo autor revela
uma série de interesses: políticos e econômicos. No Rio, por exemplo, o maior centro de monitoramento do mundo foi implantado por iniciativa da Prefeitura. Em Búzios, o modelo é diferente, porque foi aplicado por uma concessionária de energia elétrica. Em Recife, o projeto de um bairro inteligente em torno do estádio construído para a Copa 2014 partiu de uma construtora, por isso, está focado na construção de prédios inteligentes. As características variam muito conforme os autores dos projetos", diz.

O caso de Olinda é diferente. A cidade não conta com grandes infraestruturas de TIC, no entanto, foi selecionada, em setembro de 2014, para participar da Rede de Cidades Inteligentes e Humanas, em parceria com a União Europeia.
As cidades integrantes da rede (dos 33 municípios, dez são brasileiros) irão trocar experiências em inovação, e fortalecer a captação de recursos
que viabilizem a implantação de projetos de tecnologia em cada cidade. A maioria das cidades incluídas é da região metropolitana e do interior do país. E o mais importante para a rede é desenvolver projetos sustentáveis, que incluam
a tecnologia, mas que visem o bem-estar da população em primeiro plano.

De acordo com o Fórum Nacional de Ciência e Tecnologia da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), cada município participante, poderá receber até 50 mil euros para a implantação do trabalho de cidade inteligente, por meio de parceria
com o Banco Mundial.

As primeiras reuniões já iniciaram e, segundo o diretor de Tecnologia da Secretaria de Turismo, Desenvolvimento Econômico e Tecnologia de Olinda e vice-presidente de empreendedorismo e inovação da FNP, Cláudio Nascimento, a experiência dos dez meses de adesão será debatida com outros 100 prefeitos
nos dias 24 e 25 dentro da Campus Party, em Recife. Ele conta que o ponto forte de Olinda é a administração colaborativa: "Tudo que ocorre na cidade tem que ser acordado com os moradores.Temos um diálogo inclusivo, no qual a
população tem voz participa com as academias, ONGs e empresas. No momento, desenvolvemos um projeto para cuidar do solo em conjunto com a população", afirma.

Como alguns projetos na área de turismo, que é muito forte no município, ele ressalta que todos os patrimônios tombados são sinalizados com placas em inglês e português, e que está criando um aplicativo com QR Code, o Olinda Portal do Turismo, para que as pessoas obtenham informação dos monumentos
e pontos turísticos da cidade. "O nosso principal desafio, a ser discutido nos encontros a rede, é descobrir maneiras de implantar conexão sem impactar os imóveis tombados. Um terço da cidade é tombado como patrimônio histórico", conta.

Cidades Cognitivas
Enquanto as cidades nordestinas começam a se planejar para se tornarem cidades inteligentes, a IBM surge com o conceito de Cidades Cognitivas. Segundo Roberto Ramalho, executivo da IBM Brasil responsável pela
região Norte/Nordeste, computação cognitiva é hoje o principal foco da multinacional. Ele explica que toda a parte de análise preventiva com tecnologias como o Big Data, que é o que vem sendo usado hoje em várias
cidades do mundo, é importante, mas a empresa já está apostando na computação cognitiva. "Além de prever o que vai acontecer, o computador vai aprender com tudo que aconteceu. Essas informações, armazenadas
gradativamente, servirão para ações futuras. É como se fosse uma inteligência artificial, só que ainda mais avançada, pois nem toda inteligência artificial consegue aprender", conta.

Ramalho citou como exemplo o tratamento de câncer, com o qual o Watson (nome do supercomputador da IBM) vem sendo testado. "Imagine você que há uma quantidade de informação absurda em relação ao câncer, em papers e publicações científicas no mundo inteiro. A capacidade de a mente humana
processar tudo isso é limitada. Então, o médico pode contar com o auxílio do Watson para produzir um bom diagnóstico e sugerir o tratamento mais indicado. A máquina varre o histórico médico do paciente, varre todas as informações disponíveis sobre o câncer e sobre os tratamentos possíveis. Em seguida,
sugere ao médico um diagnóstico e o melhor tratamento para o caso", explica.

É claro que a decisão final será do médico, continua Ramalho, mas a computação cognitiva vai ajudá-lo a tomar, cada vez mais, decisões
melhores e, eventualmente, evitar um processo ou outro que não seja tão crítico. Segundo o executivo, o sistema já está disponível "Temos projetos com vários hospitais dos Estados Unidos. Aqui no Brasil, temos algumas discussões em andamento, mas ainda não podemos divulgar", afirmou.

A IBM foi a principal parceira da prefeitura do Rio de Janeiro, para a criação do Centro de Operações da Capital, em 2010, o maior do mundo. Graças ao centro, o Rio de Janeiro foi eleito, em 2013, a cidade inteligente do ano na Smart City Expo World Congress, feira sobre cidades inteligentes realizada em Barcelona, na Espanha. E, por três anos consecutivos, foi apontada como
uma das 21 comunidades mais inteligentes do mundo, pelo Inteligent Community Fórum (ICF).

"Tudo começou com um Workshop sobre 'como fazer para prevenir coisas', que demos à prefeitura do Rio", conta Ramalho. Segundo ele, a IBM conversa,
hoje, com as principais capitais do Nordeste para implementar soluções semelhantes, relacionadas ao conceito de cidades inteligentes. "Apostamos na
prevenção de riscos, na integração entre os diversos órgãos da prefeitura e no uso de tecnologias para promover uma melhor gestão das cidades. Cada vez
mais, haverá sensores para indicar as coisas e tudo estará conectado ao mesmo tempo. Hoje por meio de Big Data é possível prever eventuais problemas com o trânsito, com desastres naturais, com a distribuição
de água, de energia. As tecnologias estão aí, e os gestores já as enxergam como necessidade, mas nem todo mundo implantou. A grande questão
é quem quer implementá-las e quem tem condições para isso", finaliza.


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