A seção Entrevista é apoiada por:

Este será o ano do bitcoin

Após um ano de recessão e inflação em alta no Brasil, será 2016 o ano dos bitcoins, as famosas moedas virtuais?
Para o recifense, dono dos sites Pagcoin e Foxbit, João Paulo Oliveira, a resposta é sim. Mestre em computação pela Universidade Federal de Pernambuco e futurista pela Singurality University - na Nasa Research Park, Califórnia -, João Paulo, de 28 anos, apostou nos bitcoins em 2014, um ano de crise para o dinheiro virtual. No ano passado, ele acompanhou a fase de retomada e viu a corretora Foxbit bater o recorde, ao conquistar 49% da fatia de mercado do país. No Nordeste, Aracaju tem a maior comunidade de usuários e concentra o maior número de lojas físicas que aceitam o pagamento em bitcoin.
Nesta entrevista ele opina sobre o futuro dos bitcoins e fala sobre as vantagens em utilizar a moeda.

Como está a adesão ao bitcoin no Brasil?
Quantas transações foram realizadas no ano passado? Segundo o Bitvalor, que é quem monitora todas as transações no país, até para dar uma dimensão de mercado, o bitcoin movimentou cerca de R$130 milhões o ano todo. Essa movimentação equivale a uma base de 20% ao mês. A adesão ainda é tímida, diante dos números. O crescimento vai depender muito da divulgação e do conhecimento por parte da população. Vão levar alguns anos para ser comum. Poucas pessoas conhecem e grande parte da utilização é para fazer transações internacionais. Não há muita vantagem em comprar um café na esquina com bitcoin. Mas, se eu quiser mandar a mesada para o meu filho na China, a vantagem será enorme porque com o bitcoin é possível mandar dinheiro para qualquer lugar do mundo sem ter custo adicional. Já a moeda oficial passa por cinco ou seis empresas intermediárias até chegar ao país de destino e cada uma dessas empresas cobra uma taxa.

Além da isenção de taxa, que outras vantagens os usuários de bitcoins podem ter?
Sem dúvida, a segurança. O lojista do outro lado não vai ter nenhum dado seu de pagamento, enquanto que, com o pagamento em cartão, você precisa digitar o número do cartão, do código de segurança, além de dados pessoais. A gente tem uma tecnologia da década de 70 que não foi pensada para a era digital. A fraude de cartão de crédito é muito comum. Por surgir em um período de tecnologia mais evoluída, a moeda virtual é muito mais segura em relação à fraude.

Em 2014, a moeda teve a sua primeira crise, quando a cotação chegou a ter um recuo de 82%. Quais são os riscos de que haja outra queda drástica?
O bitcon é uma moeda deflacionária, então está sempre se valorizando. Mas é complicado dizer que o preço sempre vai subir, embora eu ache que vai continuar subindo. A crise de 2014 se deu por causa da supervalorização em um espaço de tempo muito curto. O bitcoin era extremamente desconhecido em 2013. No final daquele ano, muita gente descobriu a tecnologia e come- çou a comprar. Em poucos meses, a cota- ção que era de U$30 saltou para U$1.500. Naturalmente, foi uma bolha porque não havia usos significativos da moeda, o que culminou na crise, em seguida.

Em 2015, a moeda valorizou-se 102%. O que esse crescimento representa?
Ele é fruto do entendimento da tecnologia. As pessoas começam a entender que podem mandar valor para outra sem nenhum intermediário. Quando o bitcoin surgiu, causou muita desconfiança. Muita gente achando que era um golpe, uma pirâmide. Os primeiros usuários faziam operações ilícitas e a moeda ficou com uma má impressão. Agora, muitos bancos começam a reconhecer e a utilizar. A bolsa de Nova Iorque passou a acompanhar oficialmente o valor dos bitcoins. A moeda passou a ter legitimidade nos Estados Unidos e na Europa. A Grécia entrou em crise e havia um risco muito grande de que aquele país adotasse uma moeda temporária. Isso fez com que os gregos comprassem a moeda digital, já que ela não pode ser controlada por nenhum governo. Quanto mais restritivo é o país, a moeda acaba sendo mais forte. Ela é super popular na Venezuela, por exemplo, por causa da restrição com o dólar. A China concentra 80% do volume de bitcoin.

O que te levou a lançar o Pagcoin e Foxbit?
Eu estava estudando fora do país e tive acesso e oportunidade de estudar os bitcoins. Achei fascinante e que traria um grande impacto para a nossa cultura. Voltei para o Brasil e lancei o Pagcoin. Mais ou menos, um ano depois, eu me associei ao Foxbit, que é uma corretora. A Foxbit intermediou R$50 milhões no ano passado e representa 40% do mercado brasileiro de Bitcoin.

Como funciona o Pagcoin? As empresas precisam ter um cadastro?
O Pagcoin intermedia vendas. Nós trocamos os bitcoins do consumidor por real e depositamos na conta das empresas, no máximo, em dois dias úteis. A empresa tem que ter um cadastro no nosso site. Ao vender um produto em bitcoin, as lojas emitem um bilhete de pagamento. A vantagem para as empresas é a quase isenção de taxa. Geralmente, é cobrado 1%. Grande parte dos nossos clientes são empresas aqui no Brasil que fazem cobrança no exterior. O custo é muito menor. Nós atendemos, hoje, cerca de 600 empresas. Temos aproximadamente 1.500 pontos físicos em todo o país aceitando bitcoins.

Como está a utilização da moeda no Nordeste?
De longe, Aracaju é a capital que mais utiliza. Há uma comunidade muito forte. Temos 220 lojas lá. Inclusive eles até criaram o mapa bitcoin, que mostra a localização desses pontos comerciais. Em seguida, vem Salvador e Recife. Mas eu não sei estimar, por ora, qual dessas duas se destaca. Inclusive, este mês o Pagcoin, o Foxbit e a Tempest realizam um tutorial no auditório da livraria Cultura, em Recife, para fortalecer a utilização na capital. O evento é voltado para pequenos empresários, mostrando que eles podem pagar menos impostos ao aderir à moeda virtual. Vamos apresentar tecnologias e mostrar na prática como é o custo.

Por que manter dois sites para lidar com bitcoin e não um?
Tecnicamente, era possível reunir as duas funções em um site só, mas são duas empresas com softwares, objetivos e públicos diferentes. Enquanto uma atende apenas Pessoa Jurídica, a outra atende, em sua maioria, Pessoa Física.

Quantas transações já foram feitas pelo Pagcoin?
R$50 milhões, este ano. E a expectativa é aumentar este valor em 3 vezes em 2016. Não há site no Brasil que concorra com o Pagcoin. Há concorrente para o Foxbit, mas nós somos líder de mercado. Temos 40% do mercado, aproximadamente, e, em dezembro, a startup bateu o recorde com um percentual de 49%. A nossa plataforma é a mais barata. Esse é um dos motivos que a torna a mais utilizada.

Quais são os principais desafios das duas startups?
O principal desafio hoje é em relação à regulação. Estamos conversando muito com o governo para saber como será regulado. Para a Receita Federal o bitcoin é uma ação, como a da Petrobras ou da Vale do Rio Doce. O Banco Central o enquadra como arranjo de pagamento. Ou seja, os reguladores ainda estão meio confusos quanto ao enquadramento disso. É muito cedo para falar em lei hoje. Você vê que só depois de três décadas, o país sancionou uma lei com entendimentos claros sobre a internet. E essas conversas estão começando a acontecer também com o bitcoin.

Qual a sua opinião sobre um projeto de lei do deputado Reginaldo Lopes, que visa extinguir a circulação e uso do dinheiro em espécie?
A proposta do projeto é acabar com a moeda física e determinar que as transações financeiras sejam realizadas apenas por meio digital. Houve uma audiência pública para discutir a proposição, da qual eu participei. Até foi legal, porque eu expliquei como funcionavam os bitcoins. Mas isso não tem fundamento, todo mundo entendeu que não há como acabar com a moeda física.

É possível ganhar dinheiro com os bitcoins sem, necessariamente, ser um minerador?
Existem muitos investidores. São pessoas que olham a valorização de compra e venda de bitcoin. Basta um investimento inicial baixo para entrar no negócio, mas quem quer ganhar dinheiro dessa forma necessita de tempo para estudar o mercado, saber como funciona, ler muita notícia de fora. Ninguém ganha dinheiro sem esforço.

No início do Pagcoin, você investiu R$200 mil e contava com quatro sócios e seis colaboradores. Como está esse quadro hoje?
O Pagcoin foi criado em abril de 2014. Nós continuamos com a mesma equipe. Em alguns momentos contratamos serviço temporário, mas, no geral, temos a mesma equipe. A ferramenta tem um rendimento muito menor comparado ao Foxbit, mas já opera no azul. O Pagcoin é um negócio que cresce devagar, que tem um foco muito maior em educar as empresas. Com ele, apostamos em longo prazo. Talvez leve dez anos para começar a entrar na vida das pessoas. Já o Foxbit tem um retorno bom e é líder de mercado.

Como você imagina o futuro do bitcoin?
Estamos muito animados para 2016. Primeiro porque está havendo um entendimento maior do que é a tecnologia e isso está fazendo com que as transações virtuais sejam mais procuradas. Muitas empresas estão utilizando. Este será o ano chave para essa cultura. Em 2013, as pessoas, de modo geral, o descobriram. Em 2014, houve a rejeição. Em 2015, os bancos voltaram atrás e reconheceram a legitimidade do dinheiro virtual. Portanto, 2016, sem dúvida, será um ano de crescimento.
  Leia a revista

Carregando...